Acho que todo escritor (ainda que amador como eu) precisa de um pouco de tristeza.
Precisa de um dia nublado e frio
Um cigarro e um café que esfria enquanto a gente deixa a alma nua
Afinal, é isso que um escritor faz, não é?
Despe a alma em versos e letras
Cada corpo que cai leva um pedaço do meu
E eu vou te explicar o motivo.
Dói.
Se você consegue ver pessoas se matando
Passando frio
Fome
Morrendo
E continuar seu café na mesa de trabalho
Chegar em casa e brincar com o cachorro
Comer seu jantar
Beijar sua família e dormir
Eu te admiro, e ouso dizer que invejo.
Eu te invejo.
Cada corpo que cai me leva um pedaço de pele, de unha, de mim mesma
E a gente vai caindo no absoluto vazio da impotência
Eu não posso fazer nada, talvez ninguém possa.
Mas pra você não importa
Você vai chegar na sua casa
Brincar com seu cachorro
Comer seu jantar
Beijar sua família e dormir
Igual a todos os dias
Como se nunca tivesse lido esse texto
Ou a noticia
Ou o expressão de sofrimento de quem pede um prato de comida
E eu te invejo mais uma vez, por não se importar.
Quizá vai comentar com alguém que "aquela menina doidinha escreveu um texto esquisito dando lição de moral de novo e logo depois postou uma foto bonita"
E vocês vão rir
E não vão me levar a sério, afinal, quem levaria?
Vão dar uma garfada no arroz com feijão ou uma mordida no hambúrguer e vida que segue.
Ou então vai falar no almoço de Páscoa da ameaça de bomba, da guerra na Síria, da crise no país enquanto desfruta de uma casa quente e chocolate
Eu não te julgo, eu te invejo por desfrutar de todos esses prazeres sem culpa.
Cada corpo que cai leva um pedaço do meu, mas deve ser mal de escritor - Mesmo amadores como eu.
Deve ser mal de amadores.